Sur le site Web de l’Institut Humanitas de la Universidade do Vale do Rio dos Sinos (Brésil), une traduction de l’interview d’Antonio Casilli, auteur de Les liaisons numériques. Vers une nouvelle sociabilité ? (Ed. du Seuil), parue sur le quotidien italien La Repubblica le 10 janvier 2012. Initialement réalisée par Fabio Gambaro, l’interview a été traduite en portugais par Moisés Sbardelotto.
“A Internet aumenta o capital social”. Entrevista com Antonio Casilli
“O espaço virtual é uma teoria nascida da literatura. Ao contrário, vivemos em uma realidade mista”. “As revoluções não são feitas pelo Twitter e pelo Facebook, mas sim pelas pessoas que vão às ruas”. O estudioso Antonio Casilli publicou um livro na França em que desmente muitos dos clichês sobre o universo do computador.
A reportagem é de Fabio Gambaro, publicada no jornal La Repubblica, 10-01-2012. A tradução é de Moisés Sbardelotto.
Transformando a nossa percepção do espaço, do corpo e das relações sociais, o universo das novas tecnologias digitais nos obriga a refletir criticamente sobre a natureza profunda da realidade em que vivemos. Uma reflexão à qual Antonio Casilli se dedica proficuamente, sendo especialista em culturas digitais e que, há vários anos, se mudou para a França, onde as suas análises sobre as novas formas de socialidade das redes são muito apreciadas e discutidas.
Em seu último livro, Les liaisons numériques (Ed. Seuil, 331 páginas), o estudioso critica radicalmente os falsos mitos que acompanharam o desenvolvimento das novas tecnologias, começando pelas ameaças do espaço virtual: “A teoria da desmaterialização da realidade produzida pelas novas tecnologias digitais é uma teoria filha da literatura dos anos 1980”, explica Casilli, que, depois de trabalhar na École des Haute Etudes en Sciences Sociales, leciona hoje no Telecom Paris Tech.
“Mais do que na dicotomia entre espaço real e espaço virtual, nós todos vivemos hoje em uma realidade mista, que poderíamos definir como uma realidade aumentada, em que o real é aumentado, amplificado, transformado pelo virtual. A nossa vida diária se desenvolve em uma contínua sobreposição de espaços reais e espaços cognitivos digitais. Por exemplo, enquanto estamos em um carro ou em um trem, nos movemos fisicamente no espaço, mas, ao mesmo tempo, graças aos smartphones, nos movemos também em outra dimensão virtual”.
Eis a entrevista.
A nossa relação com o espaço fica alterada?
O espaço se torna híbrido, e nós o percebemos como tal, reconfigurando-o continuamente. Exemplo disso é a separação entre espaço privado e espaço público, que está em contínuo movimento. Antes da Internet, a fronteira era bastante definida. Mas agora as mídias sociais permitem que se projete o espaço privado na rede, ou seja, em um contexto público. O Facebook ou o Twitter põem constantemente em discussão as nossas categorias de privado, que certamente não se dissolve, mas se reconfigura.
A privacidade não é mais a de antigamente?
Hoje, a privacidade não é mais “o direito de ficar sozinhos”, como dizia Louis Brandeis. A definição da privacidade é móvel e deve ser continuamente renegociada de acordo com as pessoas e as situações. O Twitter nos obriga a nos interrogar continuamente sobre a fronteira entre público e privado. Essa ginástica mental é muito cansativa. Para reaprender como adultos o que compartilhar e que não, gastam-se muitas energias e correm-se risco que depois devem ser pagos. No fundo, todos nós, hoje, estamos fazendo um aprendizado coletivo das novas mídias sociais. E, naturalmente, não é fácil encontrar a medida certa.
Nessa evolução, o corpo se torna uma interface entre nós e o mundo digital…
O espaço digital convida o corpo a entrar em cena na realidade virtual. Mesmo os blogs são uma maneira de entrar em cena, confrontando-se com os outros, o que sempre implica uma redefinição da percepção do nosso corpo com a escolta da imagem reenviada pelos outros. Nas mídias sociais, os outros intervém para validar a representação de nós mesmos. Assim, o corpo, que era um projeto de si, torna-se projeto de nós, para usar a terminologia de Michel Foucault. Naturalmente, se essa é uma oportunidade que permite enriquecer constantemente a nossa personalidade, também é verdade que tal situação pode produzir uma crise de identidade.
Com respeito às relações entre corpo e mundo digital, há quem advirta contra os riscos cognitivos da nossa dependência às novas tecnologias. O que você acha?
A informática é um prolongamento das mnemotécnicas do passado, que, naturalmente, não estavam voltadas a esvaziar o nosso cérebro, mas sim a torná-lo mais eficaz. Portanto, os computadores devem ser considerados como uma extensão da memória, e não como uma ameaça às capacidades cognitivas. O universo da informática é, para nós, uma espécie de prolongamento cognitivo, além de social, que nos permite um maior número de relações. A agenda do celular ou a lista de amigos no Facebook amplia o círculo dos conhecidos com quem mantemos contato.
Mas a Internet muitas vezes é acusada de dessocializar os indivíduos…
É um falso mito. Na realidade, a Internet produz novas formas de socialidade que nos permitem modular melhor o equilíbrio entre laços fortes e laços fracos, ou seja, aqueles laços potenciais que solicitamos de modo descontínuo. No Facebook, se, no início, prevalecem os contatos com as pessoas que são mais importante para nós, em seguida, tornando-nos amigos de amigos, ampliamos o círculo dos laços fracos, fazendo-os durar no tempo. No fim, a proporção entre laços fortes e fracos é muito diferente da que está presente na vida real.
Consequentemente, as mídias sociais oferecem uma socialidade mais rica, que nos permite entrar em contato com ambientes que, anteriormente, estavam fechados para nós. Antes da Internet, vivíamos em uma sociedade de pequenas caixas – a família, o país, o trabalho etc. – dentro da qual estávamos unidos aos outros por fortes laços. Com a Internet, essas caixinhas continuam existindo, mas, além delas, dispomos de passarelas para muitas outras caixas, isto é, para outras realidades sociais, com as quais talvez conservamos apenas laços fracos. Enfim, encontramo-nos no centro de redes glocais, no sentido de que são globais e locais ao mesmo tempo.
O que muda para o indivíduo?
As vantagens são múltiplas, sobretudo em termos de capital social, isto é, o conjunto dos recursos sociais que cada indivíduo tem à disposição para se realizar no plano pessoal, profissional, social, cultural etc. As mídias sociais nos permitem incrementar e modular melhor o capital social. Os amigos em rede são um recurso social.
Isso nos obriga a repensar o conceito de amizade?
Na verdade, durante séculos, privilegiamos a definição humanista da amizade. Baseando-nos em Cícero, Sêneca ou Montaigne, pensamos a amizade como um laço desinteressado, privado e caracterizado por uma cooperação forte. Em rede, à amizade tradicional que ainda continua existindo, sobrepõe-se um outro tipo de vínculo que também pode ser utilitarista. Esse laço, além de ser público e ficar gravado em um banco de dados, pode dar lugar a uma cooperação não simétrica. Na amizade clássica, a relação sempre é recíproca, não podemos ser amigos de alguém que não é nosso amigo. No Twitter, podemos seguir alguém que não nos segue.
Modificando as relações entre as pessoas, a Internet transforma também as modalidades da ação política?
Os mais otimistas enfatizam as virtudes democráticas da rede, lembrando, por exemplo, que a primavera árabe seria o típico prolongamento desse espírito democrático. Mas eu penso que a Internet é sobretudo um estilo político, que pode ser adotado por realidades ideológicas muito diferentes. Vemos isso nos EUA, onde o tanto o Tea Party quanto o Occupy Wall Street exploram a fundo as mídias sociais, dando lugar a uma organização horizontal sem hierarquia e de geometria variável. Essa estrutura pode ser muito eficaz, mas não devemos criar muitas ilusões. As revoluções não são feitas pelo Twitter ou pelo Facebook. São feitas sempre pelas pessoas reais que saem às ruas. As mídias sociais podem só coordenar, trocar e ampliar as recaídas do real. Mas sem jamais substituí-las.